Querido Bom Velhinho, Santa Clauss… não sei exatamente como você gosta de ser chamado…
Venho por meio dessas maltraçadas linhas que, aliás, escrevi a mão nessa folha de papel e o senhor já vai entender por quê. Por outro lado, não lhe envio um whats porque não disponho de um telefone celular – diferente dos meus colegas que a essa altura do ano, já lhe enviaram ‘trocentas’ mensagens mentindo que foram boas pessoas, que não fizeram nada que desagradasse a alguém, que foram educados, sérios, éticos, honestos, entre outros absurdos. E como contrapartida, certamente todos eles lhe pediram inúmeros e caros presentes. Aliás, por falar em telefone celular, o senhor sabia que no Brasil existem mais smartphones do que pessoas??? E eu acredito seriamente que sou uma pessoa e não tenho um. Essa conta não fecha, o senhor não acha???
Mas enfim, resolvi lhe escrever somente porque minha mãe – que já está bem velhinha e não me vê todos os dias – me obrigou. Ela e todos os meus amigos sabem que eu não acredito no senhor. Eles também não, mas fingem que acreditam para obterem alguma vantagem em troca. E o senhor sabe por quê eu não acredito em Papai Noel? Porque o senhor é um bom velhinho apenas para os outros. Para mim nunca foi. Não me trouxe nada daquilo que eu lhe pedi ao longo de toda a minha vida. Eu sim, sou uma pessoa exemplar, tenho bom comportamento, ajudo na limpeza, na cozinha, não brigo com meus colegas na hora do futebol, assisto ao culto… Por isso, todos parecem gostar de mim. Menos o senhor…
Desde que aprendi a escrever é sempre a mesma coisa: cartinhas e mais cartinhas pedindo uns presentinhos. Coisas simples, baratas, nada que um Papai Noel de classe média-baixa não pudesse me trazer. E qual foi a sua atitude comigo desde sempre? Braços cruzados, fingindo que não me via. Cara amarrada. Por um momento até pensei que eu fosse invisível. O senhor jamais foi na minha casa. Inclusive, no seu lugar preferia não ‘dar as caras’ por lá mesmo. O que tem de neguinho querendo lhe pegar lá ‘nas quebradas da vila’ não é brincadeira. Sem falar que, na minha opinião, o senhor deveria ser preso. Fica só pegando criancinhas para sentar no seu colo, né? Se a turma do politicamente correto não fosse tão cínica e hipócrita, garanto que ia lhe denunciar como um pedófilo nojento. E alcoólatra, porque essas bochechas vermelhinhas e essa cara de bobo alegre nunca me enganaram. E as renas, hein? Já ouviu falar em homofobia? Rudolph é o nome de uma delas, né? Ahã, sei…
Mas a verdade é que o senhor não está nem aí com esse pessoal. O seu negócio é aparecer na TV fazendo comercial de tudo quanto é coisa que o dinheiro pode comprar; sentar naquela poltrona enorme e vermelha na área mais elitizada do shopping; aquele “Jingle Bells” irritante entoando no fundo – que cá entre nós ainda é melhor que a Simone cantando “Então é Natal, e o Que Você Fez?” – e todas as pessoas na sua volta com aquele sorrisão de propaganda de margarina…
Mas agora o papo é reto: escrevi esta cartinha para o senhor porque aqui no presídio eu não tenho acesso ao computador das facções e nessa época do ano os ‘manos’ disputam o celular a tapa aqui quando os carcereiros relaxam. Na verdade, eu quero lhe pedir de presente o relaxamento da minha pena para o regime semiaberto. Com o consórcio Lula-STF ficou mais fácil, né? Tornozeleira eletrônica, tá ligado?… Mas já sei que não vai adiantar, porque quando eu era bonzinho o senhor não me atendia, imagina agora, quando descobrir o que eu fiz para vir ‘morar aqui’.
Velhaco infame.
Daniel Andriotti
Publicado em 8/12/23