A maior tragédia da aviação em território brasileiro aconteceu há exatos 17 anos, em julho de 2007. Para quem não lembra, o voo 3054 da TAM partiu do aeroporto Salgado Filho em Porto Alegre no final da tarde e fez uma viagem tranquila até tentar pousar 1 hora e meia depois no aeroporto de Congonhas, em São Paulo. Escrevi ‘tentar pousar’ porque o Airbus A-320 não conseguiu frear durante a aterrissagem e chocou-se contra um edifício da própria companhia aérea, matando 187 pessoas que estavam a bordo e outras 12 que trabalhavam no prédio. Perdi amigos naquele acidente. Aliás, como o avião havia saído de Porto Alegre, quase todos os gaúchos conheciam alguém que estava naquele voo.
Um ano antes, um Boeing da Gol havia se chocado em pleno ar contra um jato executivo, tipo Legacy, em plena selva amazônica. Morreram todas as 154 pessoas que estavam no avião da Gol. Somente esses dois acidentes, ocorridos em menos de um ano sob o espaço aéreo brasileiro mataram, juntos, 353 pessoas. Talvez por isso, filósofos garantem que há dois tipos de pessoas que viajam de avião: aquelas que tem medo e as que mentem que não tem medo. Em tempo, eu estou nesse segundo grupo…
Nesse momento, em que o principal e maior aeroporto do Rio Grande do Sul está inativo em função das inundações, há quem diga que a base aérea de Canoas; e os aeroportos de Pelotas e de Caxias – os três que permitem pousos e decolagens para aviões de grande porte – tornaram essas operações mais perigosas para quem precisa utilizar esse meio de transporte no Rio Grande do Sul. Pois então, contra fatos não há argumentos: de acordo com um estudo da universidade americana de Harvard, um em cada 1,2 milhão de voos pode sofrer um acidente – e uma em 11 milhões de chances de ele ser fatal. Numa comparação estatística, a chance de sofrermos um acidente de carro – principalmente nas estradas brasileiras – é de 200 mil vezes maior. Claro que sair ileso de um acidente de carro também é muito mais provável do que sobreviver a um desastre de avião. Mas agora vem o tiro de misericórdia: o Brasil é o quinto país com a aviação civil mais segura do mundo.
Na verdade, o avião desperta pelo menos três tipos de angústia nas pessoas ansiosas e que, por vezes, pode beirar o irracional: medo de a aeronave cair (aerofobia), medo de altura (acrofobia) e medo de estar em locais fechados, sem uma saída fácil ou auxílio disponível (agorafobia associada à claustrofobia). E para essa gente não adianta os especialistas dizerem que a temida turbulência não derruba avião, garantindo que eles são fabricados para esse tipo de ‘saculejos’ provocados por diferentes correntes de ar. Essa semana, um Boieng da companhia Air Europa, com 325 passageiros a bordo e que voava de Madri, na Espanha, para Montevidéo, capital do Uruguai, precisou fazer um pouso de emergência em Natal, no Rio Grande do Norte, para o atendimento de pelo menos 30 passageiros que ficaram feridos após uma turbulência durante o voo. Mas porquê, então, com as outras 300 pessoas que estavam a bordo não aconteceu nada? É provável que naquele momento, os feridos viajavam de pé ou sem o cinto de segurança afivelado.
Conheci um velho mecânico da saudosa Varig que dizia: “aviões não caem. Alguns aviões são derrubados. Seja em terra, por falta de manutenção; seja em vôo por erro de pilotos ou do controle do tráfego aéreo. Em qualquer dos casos, o erro é sempre humano”.
Na próxima vez que você entrar num avião, lembre-se disso. Aperte seu cinto, abra a cortina da janela, feche a mesinha na sua frente e curta a viagem. Mãos trêmulas, frio na barriga, coração acelerado, pânico e falta de educação com a tripulação e demais passageiros, não vão mudar em nada a habilidade ou a falta dela na cabine de comando. Se mesmo assim, passar pela sua cabeça que o piloto poderá sofrer um mal súbito a 11 mil metros de altura e voando a 800km/h, não se preocupe com a sua segurança: tem outro piloto ao lado dele que poderá pousar o avião suavemente no aeroporto mais próximo. E não por outro motivo que não seja um atendimento médico mais rápido e eficiente ao colega. Relaxe. Só quem morre na véspera (de Natal) é o peru.
Daniel Andriotti
Publicado em 5/7/24