Essa semana o mundo ficou perplexo com imagens de pessoas – em sua maioria civis afegãos – tentando sair do país agarradas na parte externa de um avião militar americano que decolava do aeroporto de Cabul. Momentos depois, o vídeo mostra pelo menos duas delas caindo da aeronave em pleno vôo e, algumas agências de notícias, afirmaram que sete morreram atropeladas ainda na pista. Isso porque horas antes, o grupo fundamentalista islâmico e radical Talibã havia (re)tomado o poder no Afeganistão, assumindo a autoridade máxima em todas as questões políticas, religiosas e militares daquele país.
Escrevi ‘retomado’ porque de 1995 a 2001 o Talibã já havia exercido o poder no Afeganistão. No entanto, com os atos terroristas de 11 de setembro, os Estados Unidos invadiram o país com a intenção de capturar Osama Bin Laden, réu confesso dos atentados. Isso porque os americanos sabiam que o regime Talibã dava abrigo à organização terrorista de Bin Laden, a Al-Qaeda. Só que ele não estava lá. Quando foi executado, em maio de 2011, estava em Islamabade, capital do Paquistão.
Mas enquanto não encontrava Bin Laden, os EUA foram mostrando – e intimidando – os afegãos com o seu poderio militar. A estratégia do então presidente George W. Bush não parecia tão ruim: o plano era fortalecer o governo e o exército daquele país para uma certa “redemocratização” na esperança de evitar que o Talibã retomasse o poder. Ao longo de duas décadas, os americanos mobilizaram quase 100 mil militares e investiram US$ 83 bilhões para treinar e equipar as forças de segurança afegãs. Durante o governo Barack Obama, a situação permaneceu mais ou menos a mesma. No entanto, Donald Trump, um crítico da presença militar dos EUA no Afeganistão, começou a retirar suas tropas de lá. E o atual, Joe Biden, terminou o serviço.
Ao pressentir que isso ocorreria, o Talibã já se reorganizava silenciosamente para a retomada do poder que, depois de 20 anos, acabou acontecendo no último domingo imediatamente após a fuga do até então presidente Ashraf Ghani para a República do Tajiquistão. Depois do leite derramado, os EUA e a ONU impuseram sanções ao Talibã e a maioria dos países mostrou poucos sinais de que reconhecerá o grupo diplomaticamente, com exceção da China, que já sinaliza cautelosamente que pode reconhecer o Talibã como um regime legítimo. Que perigo…
Mas por quê o Talibã é tão radical e temido pelo mundo afora? Pergunte para uma mulher afegã. Elas não têm vez para nada e tornam-se as principais vítimas da brutalidade do regime. Afegãs não podem rir em voz alta nem trabalhar fora de casa, a não ser algumas médicas e enfermeiras; e nem estudar em qualquer instituição de ensino. Caso tenham algum problema de saúde, também não podem ser atendidas por médicos homens. Fazer compras? Somente se forem atendidas por mulheres desde que ambas estejam com o corpo totalmente coberto por burkas. Nada de praticar esportes, frequentar clubes recreativos, andar de moto ou de bicicletas, fotos, filmagens, cinema e TV. E na hora do aperto, jamais utilizar banheiros públicos. Detalhe: caso andem pela rua e não estejam acompanhadas pelo pai, marido ou irmão, estarão sujeitas a açoites, espancamentos e abusos verbais. Entre ‘otras cositas…’. Aos homens, no entanto, basta saber interpretar a lei islâmica descrita no Alcorão e deixar a barba crescer. Só isso.
Entendeu, caro leitor, por que as pessoas querem fugir de lá na parte de fora dos aviões, penduradas nos motores e nas asas???
Daniel Andriotti
Publicado em 20/8/21.