No último sábado, pela manhã, lá no céu, São Pedro colocou a seguinte música:
“Silvio Santos vem aí….
Agora é hora, de alegria, vamos sorrir e cantar…”
A televisão brasileira seguramente pode ser dividida em ASS e DSS. ‘Antes de Silvio Santos’ e ‘Depois de Sílvio Santos’. Sou de uma geração que domingo era sinônimo de salada de maionese e Programa Silvio Santos. Carismático e divertido, ele chegava a ficar 10 horas no ar, ao vivo. Terno, gravata e cabelo impecáveis, além do inconfundível microfone – quase ridículo mas com um som de qualidade absolutamente perfeita – pendurado no pescoço, logo abaixo do queixo. Mesmo no mais remoto reduto da Amazônia ou do Acre, não há quem nunca tenha ouvido falar de Sílvio Santos.
Senor Abravanel, nome de batismo e de origem judaica, foi desde camelô até candidato à presidência da república. Empreendedor arrojado, foi dono – entre outras 30 empresas – do Banco PanAmericano (hoje Pactual), da Jequiti Cosméticos, da concessionária de automóveis Vimave, do hotel de alto padrão Sofitel Jequitimar Guarujá, do Baú da Felicidade (comprado do amigo e depois funcionário, Manoel da Nóbrega) e, é claro, do seu xodó: o SBT, onde a maior estrela da emissora era o próprio dono. Isso porque seu verdadeiro talento e infinito prazer era estar no palco de um programa de auditório, divertindo-se com sua voz inconfundível e sua risada característica, imitada por centenas de súditos do meio artístico. Foi, por mais de 30 anos, o pior pesadelo da Globo na busca pela liderança na audiência das tardes de domingo. Ele superava até as transmissões de futebol da Globo. Até que um dia, a Globo desistiu…
Com total domínio de palco, de câmeras, de iluminação e de áudio, Silvio Santos parecia estar sempre muito à vontade contando piadas, promovendo calouros, resgatando artistas decadentes, distribuindo prêmios, abrindo a porta da esperança e jogando dinheiro em formato de aviõezinhos para a plateia, carinhosamente chamada de ‘colegas de trabalho’, que muitas vezes vinham até o SBT, em São Paulo, em caravanas de todo o Brasil. Nas horas vagas, Silvio administrava seu império, mimava as seis filhas e a mulher, criava jingles, gravava discos…
Líder nato, gentil e generoso, arrebanhou pessoas – muitas delas bastante humildes – para trabalharem com ele. E até onde se sabe, sempre foi muito fiel a todos. Desde o cabeleireiro Jassa, passando pelo assistente de palco, Roque, até o fiel escudeiro Lombardi, além da ‘cria’ que virou concorrente, porém sem o mesmo carisma: Gugu Liberato. Por essas e outras tantas, jamais haverá um outro animador de programas de auditório como foi Silvio Santos.
Animador é muito mais do que apresentador. Outros tantos já tentaram e deram com os burros n’água. Dificilmente eu carimbo a marca de ‘gênio da raça’ para alguma personalidade: mas Silvio Santos precisa figurar na maioria das disciplinas das faculdades dos meios de comunicação social daqui e do mundo. Ou seremos eternamente ingratos a um dos mais ilustres personagens que a história da comunicação contemporânea já teve.
Daniel Andriotti
Publicado em 23/8/24