Quando olhei para o Lago Guaíba, percebi que havia muitos aguapés, parte deles se movimentando sobre as águas feito catamarãs de folhas verdes; outros tantos, já atracados nas areias da nossa margem. Imediatamente, lembrei da Mãe, que já era nossa meteorologista caseira muito tempo antes dos incontáveis serviços oficiais de previsão do tempo existirem.
– Cristina, vai ter enchente.
– Como é que tu sabes, Mãe?
– Aguapés chegando são os principais sinais.
Eu acreditava, porque desde criança, pelo que eu me lembrava, se ela dizia, acontecia. Jamais duvidei da sabedoria materna.
Cada boa leitura realizada, na escrita de um texto ou na construção de gráficos, sempre penso na Mãe, é consequência natural, tornou-se hábito que faço questão de manter; sensação mais do que agradável. Lembro dos conselhos daquela mulher extraordinária, que viveu em tempos bem antigos, de pouca escolaridade, dedicada a cuidar dos filhos e da casa, da maneira como vislumbrava o futuro. Uma das conversas que tivemos, que marcou minha juventude, foi sobre a sua viuvez precoce e as dificuldades que ela enfrentou. Visionária, dizia que eu deveria me formar e ter uma profissão que me garantisse a subsistência antes de me casar.
– Príncipes encantados existem, minha filha, mas a gente não deve viver esperando por eles, dependendo deles para a própria sobrevivência.
– Por que tu estás dizendo isso, Mãe?
– Olha o que aconteceu comigo, enfrentei dificuldades ao ficar sozinha.
– Eu sei, Mãe.
– O correto, minha filha, é querer ficar com uma pessoa por amor, de livre e espontânea vontade, não porque vai nos sustentar.
Na sua inteligência fora do comum, entendendo que eu era apenas uma jovem sonhadora, cuidou para que eu seguisse acreditando no amor, mostrando-me que em qualquer circunstância é preciso estar preparada para a vida em todos os seus momentos.
Aquelas frases maternas foram fundamentais para as minhas decisões futuras, para a valorização que dou ao meu trabalho, incluindo os afazeres domésticos e a atenção com a família.
Eis que, neste exato momento, recordo do questionamento feito por uma amiga, tempos atrás, quando falávamos sobre nossas famílias. Depois de tecer elogios sobre a educação materna que recebi, ela não se conteve.
– Cristina, eu não acredito que a tua Mãe tenha sido sempre tão boa contigo.
– Ela era uma Mãe normal.
– Mas tu nunca me contaste nada de negativo, nenhum xingamento, um castigo, uma contrariedade que fosse.
– Com tanto amor e aprendizado, tantos acertos e coisas boas para lembrar, por que razão eu ficaria procurando pelos erros maternos?
Em tudo que penso e realizo, há um pouco da Mãe, o exemplo que sempre procuro seguir. Em minhas orações de todos os dias, agradeço pela sorte que tive de ser sua filha.
Valeu, Mãe!
Cristina André
cristina.andre.gazeta@gmail.com
Publicado em 6/5/22