Caro leitor, já escrevi sobre isso, mas preciso retomar esse assunto. Pense comigo na seguinte hipótese: “e se o mundo fosse uma pequena aldeia?”. Algo como o planeta Terra em miniatura. Imagine aquele globo do mapa-múndi, do tamanho de uma bola de futebol de campo que se utiliza (ou se utilizava) nas aulas de geografia do ensino médio e fundamental. Vamos lá: se ao invés de 7,5 bilhões de habitantes nessa estratosfera criada por Deus, fôssemos apenas 100. Não é 100 mil. É 100 pessoas sobre a face da Terra. Uma centena. Dez vezes dez.
Então, respeitadas as proporções conforme o mundo atual: dessas 100 criaturas, 63 seriam asiáticos, 21 europeus, 8 africanos e 8 americanos. Oceania? Zero. Antártica? apenas pinguins e focas. Pois nesse mundo dos ‘100’, seríamos 52 mulheres e 48 homens. Oitenta e nove seriam heterossexuais enquanto que 11, homossexuais. Trinta brancos. Os demais, pretos, pardos, vermelhos, amarelos. Trinta cristãos. Setenta, logicamente, não-cristãos. Seis pessoas – cinco norte-americanos e um asiático – teriam 59% de toda a riqueza do mundo. E das 100 pessoas desse nosso planeta imaginário, 80 viveriam em condições sub-humanas, a tradicional expressão ‘abaixo da linha da miséria’. Com isso, a metade dessa população sofreria de desnutrição.
Vamos em frente: setenta por cento (ou 70 pessoas) não saberiam ler, nem escrever; e apenas uma delas teria graduação universitária. Uma pessoa das 50 que viveriam em desnutrição estaria a ponto de morrer a qualquer momento, enquanto que um bebê estaria sempre prestes a nascer. Outra: na nossa aldeia haveria apenas um computador, pertencente a um único habitante.
Essa visão (nem tão) incoerente assim mostra o quanto as desigualdades – todas elas – são absurdas neste planeta. Não tenho a pretensão que estas mal traçadas linhas se tornem mais um nesse universo de textos de ‘autoajuda’ ou autoestima, longe de mim, mas pense que milhões de pessoas nessa semana gostariam de estar fazendo o mesmo que você nesse exato momento: lendo um texto. Só que elas não podem. Não podem porque estão numa UTI ou porque a UTI não foi suficiente para mantê-las vivas. Algumas não tiveram a ‘oportunidade’ sequer, de entrar numa UTI.
Por acaso, caro leitor, você já foi para uma guerra, armado, defender o seu país de ‘sabe-se-lá-o-quê’? Já foi preso? Torturado? Passou fome? Respondeu ‘não’ para todas? Então você está melhor do que 500 milhões de pessoas no mundo. Mais: conhece alguém que frequente o templo religioso que a sua fé lhe conduz sem medo de ser humilhado, preso, torturado ou morto? Se a sua resposta foi ‘sim’, saiba que no mundo 3 bilhões de pessoas diriam ‘não’. Você tem comida na geladeira? Roupas no armário? Um teto sobre a sua cabeça? Um lugar para dormir? Respondeu ‘sim’ a todas? Então você tem mais do que 75% da população mundial. Tem um dinheirinho no banco (pode ser uma poupancinha merreca)? Ou em casa, num cofrinho de porquinho ou embaixo do colchão? Na carteira? Se pensou ‘sim’, você faz parte de uma fatia da humanidade que reúne 600 milhões de pessoas, integrantes do seleto grupo dos 8% de ricos deste mundo.
Se depois de dizer ‘sim’ pra tudo isso, você ainda tiver pais vivos e, que moram juntos… você é um ser raro no universo. E mais: se chegou até aqui é porque você sabe ler, certo? Outros 2 bilhões de pessoas adultas no mundo não tiveram ‘a sorte’ de aprender…
Pense nisso antes de reclamar quando seu pão cair no chão com a manteiga virada para o lado de baixo…
Daniel Andriotti
Publicado em 13/5/22