Foi na visita a uma bela cidade que um nativo, ao saber que estávamos lá pela primeira vez, fez questão de observar que o lugar não tinha praias mas esbanjava em histórias. Imediatamente pensei em diversos locais desta minha cidade, que divide grandioso lago com a capital dos gaúchos e se orgulha da sua marca farroupilha. Fiquei imaginando quantas histórias mais poderíamos agregar a essas águas e ao heroísmo se conseguíssemos ultrapassar as fronteiras do academicismo.
Conjecturei sobre causos a respeito de gente comum, que não se destacou em guerras mas passou toda a existência neste lugar; religiosos que vivenciaram situações engraçadas; políticos conhecidos pelas opiniões controversas e as frases espirituosas; o encanto provocado pela escola de normalistas; os templos e o trabalho humanitário realizado; os carnavais e as festas famosas; os clubes sociais e a disputa acirrada no futebol.
Segui recordando de certas lojas antigas, em como seria apropriado relatar como eram, o que vendiam. Dos ônibus de pouca velocidade e feitio de capacete, nos carros de praça e nas carrocinhas negociando frutas e verduras. Seria interessante saber mais sobre a evolução do transporte público na cidade, os seus meios de comunicação, as suas escolas.
Passeando em outros pagos, me surpreendi com ideias alternativas para receber os visitantes na minha cidade. Narrativas pitorescas do conhecimento popular, como a do presidente do clube social que proibiu dançar de rosto colado; outras surpreendentes, feito o caso do técnico de futebol de um time do Ermo que foi contratado para grandiosa equipe europeia. Rememorar as divertidas e famosas festas à fantasia, as comendas e as noites alemãs; a nossa Miss RS, o título estadual do futebol, os festivais de música, as matinés de domingo no cinema que virou mercado. Os desfiles cívicos e a visita de um Presidente, as festas da Igreja Matriz.
Seria interessante falar aos visitantes sobre os imigrantes que aqui chegaram e construíram suas famílias, as influências culturais, a gastronomia. Contar das praias que um dia tiveram fama e fizeram a alegria de tantas famílias nos fins de semana. Das obras que mudaram a cidade, como a Escadaria, antes desafiadora lomba do inferno para jovens estudantes. E a chegada de investimentos noruegueses, japoneses, chilenos.
Depois de extrapolar em suposições para o turismo e a cultura da minha cidade, lembrei que há muito o que aprender sobre a história da celulose e do papel nestas terras de eucaliptos e novos traçados. Quem sabe um museu todo dedicado a esse tema, mostrando como foram as primeiras indústrias que aqui chegaram, sua evolução através de décadas.
Foi como turista que compreendi: um bom lugar para visitar precisa ter gente acolhedora com boas histórias para contar – acadêmicas e populares.
Cristina André
cristina.andre.gazeta@gmail.com
Publicado em 2/6/23