Já foi postura intuitiva, hoje é certeza: tudo na vida acostuma. E não se trata de invenção vazia, evidências construíram bases sólidas para essa minha crença, e o tempo, feito magistrado da existência, não se cansa de comprovar.
Sei muito bem que a prática do sorriso e das palavras agradáveis, quando frequentes, se incorporam em nosso dia a dia, tornando-se habituais. Isso também se dá com o avesso, feito de queixumes repetitivos e indelicadezas, que não tem outro destino senão virar rotina.
Manter postura positiva diante da vida, abrindo espaço no coração para que valorize as pequenas alegrias, é essencial por uma única razão: tudo acostuma, até felicidade.
Minha aprendizagem começou na infância. Quando retornava da escola, a Mãe perguntava sobre o que tinha acontecido de bom por lá, pedia que eu lhe contasse alguma novidade, mas nada de falar mal de professores e colegas, nem se referir à escola com desdém. E caso sentisse que havia motivos importantes para alguma crítica, tratava de me explicar que todas as pessoas cometem erros, que os nossos defeitos são facilmente reconhecidos, mas a descoberta das nossas qualidades, essa sim é tarefa árdua, exige dedicação, poucos conseguem vê-las. Depois, filosofava sobre os dias comuns, as coisas boas que havia em cada um deles, e a necessidade de falar sobre elas ao chegar em casa para alegrar toda a família.
Foi assim que me tornei adulta, elogiando professores e colegas por sugestão caseira. E tendo me habituado a fazê-lo, a vida também se acostumou a me dar provas concretas de que eu estava certa.
Mas com dois primos meus não foi bem assim que aconteceu. Apesar de receberem educação nos mesmos moldes lá de casa, os efeitos positivos demoravam mais a aparecer.
Certa vez, depois de uma manhã de equações e mapas, no auge dos seus doze e treze anos, chegaram da escola, atiraram pastas no sofá da sala e foram almoçar. Lá pelas tantas, aproveitando a distração dos pais, deram início ao falatório pejorativo sobre um dos seus professores, rindo em alto e bom som das lições ensinadas pelo educador. De repente, minha tia deu parabéns aos dois pelo que estavam falando; disse-lhes que tinha muita sorte por ter dois filhos tão inteligentes, cujo conhecimento era superior ao dos seus professores. “Amanhã, vou até o colégio pedir para a diretora que vocês deem aulas e os professores assistam”, disse ela, calando os atrevidos piás. Daquele almoço em diante, pelo menos um elogio por dia precisava ser dado à escola e aos mestres. Com o tempo, os irmãos se acostumaram a falar bem dos professores e da escola, compartilhando com a alegria os bons acontecimentos da rotina estudantil.
Aqueles que se empenham no treino de sorrisos e palavras afetuosas se adaptam a eles; e a vida, que a tudo retribui, os faz mais felizes. Aos outros, que têm nas queixas e caras feias seus lemas, resta aceitarem a ausência da felicidade, pois, constrangida, ela definitivamente se afasta.
Porque tudo acostuma, até ser feliz.
Cristina André
cristina.andre.gazeta@gmail.com
Publicado em 8/4/22