Uma vez terminada a apuração do segundo turno das eleições presidenciais de 30 de outubro, pessoas indignadas e descontentes com o resultado das urnas foram às ruas para… essa é a questão: não se sabe ao certo ainda para quê. Primeiro foram os bloqueios em muitas rodovias de diversos estados. Depois, vieram os acampamentos em frente aos quartéis pedindo intervenção militar…
Aprendi, na democracia, que qualquer tipo de manifestação é legítima. A greve, inclusive, é um direito previsto pela Constituição. No entanto, fechar estradas, por exemplo, fere um outro direito previsto na mesma Lei Básica: o de ir e vir. Pedir recontagem de votos ou auditoria das urnas é possível (será?!?!?!), mas intervenção militar não consta na mesma Carta Constitucional. Portanto, toda manifestação tem seus limites…
A mensagem principal daqueles que vestem verde e amarelo e ainda se mantém em vigília acampados na frente dos comandos militares é, pela ordem: rejeição a Lula – querendo ou não, presidente eleito. Depois, ódio ao PT. E por fim: desconfiança num sistema eleitoral injusto e desequilibrado, onde várias partes que deveriam ser neutras, tomaram posições.
Em 2013, o leitor vai lembrar: o povo foi às ruas demonstrar todo seu descontentamento com a classe política brasileira e a corrupção corrosiva infiltrada em todas as esferas do poder. O pano de fundo da época era o aumento das passagens do transporte público. O que vemos hoje é muito semelhante àquele sentimento de indignação associado ao desejo de mudança nas instituições, principalmente no sentido de dar mais transparência à governança pública. É uma revolta da população contra o atual sistema político vigente no Brasil, mas não contra a democracia.
Naquele mesmo 2013 teve início a Operação Lava Jato – hoje sepultada – mas que deu, à época, um protagonismo nunca antes visto ao Poder Judiciário. E o povo parece ter gostado tanto que passou a exigir cada vez mais da Justiça. Mas agora percebemos que há um ativismo judicial fora de controle explicitamente demonstrado pela interferência de alguns dos seus membros que, por sua vez, acaba prejudicando a engrenagem dos outros poderes, digamos, “mais humildes”. Eu, agarrado à minha ignorância política, sempre pensei que cortes constitucionais fossem mecanismos capazes de impedir que regimes tirânicos se apropriassem do poder. Não são. Até porque os tribunais não têm exércitos. Supremas cortes são organizações políticas a serviço dos grupos responsáveis pela nomeação dos seus membros. Suas sentenças são folhas de papel que tendem, fundamentalmente, a beneficiar grupos partidários que os colocaram lá. E, de posse da fatídica caneta, evitar os pseudoproblemas com outras forças suficientemente poderosas que possam lhes dar o troco.
No segundo parágrafo citei as manifestações dos bolsonaristas descontentes com o resultado das urnas. E, no calor das discussões, o Tribunal Superior Eleitoral – presidido por um membro do STF – chegou a abrir uma investigação sobre empresários que estariam fornecendo alimentos e banheiros químicos aos manifestantes. Essa pontinha insignificante do iceberg transformada numa preocupação de primeira hora me faz deduzir que nossas supremas cortes não protegem a Constituição. Por isso, regimes democráticos não são como uma casa que após construída, você pode simplesmente entrar para dentro e morar. Eles se assemelham muito mais a um corpo saudável, que precisa de alimentação adequada, monitoramento dos sinais vitais e exercícios constantes. Caso contrário, morre fácil fácil…
#Fica a dica.
Daniel Andriotti
Publicado em 09/12/22