Gosto de conversar com pessoas queridas, da família e das amizades, filosofar compartilhando a boa mesa, ouvir histórias interessantes e contar sobre alegrias novas e antigas. Em momentos assim, a vida reforça seu ensinamento sobre a felicidade, de como esse sentimento faz questão de aproximar de quem se alegra por natureza.
E por ter esse prazer em conversar, dificilmente consigo ficar mais de dois ou três minutos em silêncio quando há gente por perto, aguardando atendimento no consultório do dentista ou no guichê do banco; na plateia do show ou escolhendo verduras no mercado. E nestas breves e casuais trocas de ideias, tenho encontrado gente sorridente, educada e de bem com a vida, pessoas que também apreciam o lado bom da humanidade.
Algumas vezes, porém, fui pega de surpresa por seres mal-humorados, que fizeram questão de mostrar requintada antipatia por seus pares humanos. E decidi aproveitar cada uma dessas experiências desagradáveis como boa e clara aprendizagem sobre o que não se deve ser nem sentir. Como aconteceu, tempos atrás, no final de um outro novembro.
Dezembro se aproximando, parei em frente de uma beleza de vitrina, já com enfeites natalinos, onde estavam expostos vestidos. Enquanto eu admirava as novidades e a decoração, outras duas mulheres pararam e fizeram o mesmo. Pelas idades e as fisionomias, deviam ser mãe e filha. De repente, começou a tocar uma tradicional música de Natal no interior da loja e o som chegou até a calçada, onde nós três estávamos. Inspirada pela música, me distraí pensando na alegria de cada fim de ano que chega, com suas boas lembranças da infância, seu apelo a favor da solidariedade, seus reencontros familiares.
Atenção de volta, esbocei um discreto sorriso às duas mulheres que ali estavam. Apesar de não conhecê-las, imaginei que ambas estivessem felizes pelas recordações da infância e do Papai-Noel. Que também lhes agradasse a proximidade das festas. Mas errei feio.
Meu sorriso discreto não foi retribuído, ao contrário. Na tentativa de ser agradável e compartilhar bons sentimentos, recebi duas carrancas, uma de cada geração.
A mais jovem, parecendo ler meus pensamentos, me dirigiu uma rajada de palavras que quase me derrubaram. Em alto e bom som aquela moça-azeda falou a sua mãe: “Que ódio eu tenho dessas musiquinhas! Não gosto de Natal, nem de Ano-Novo, com aquelas reuniões chatas e aquelas comidas sempre iguais. Não sei pra que isso”.
Aquela declaração me assustou pela aspereza e o tom de voz, não combinava com a música nem com a vitrina bonita. Muito menos com uma jovem para a qual a vida recém estendera o tapete. E o que me deixou ainda mais impressionada foi a natural exposição do coração raivoso e insensível que carregava.
Em sincronia casual, saímos, as três, da frente daquela vitrina. Eu para um lado, as duas para outro.
Voltei para casa pensando como gosto de conversar com pessoas queridas, da família e das amizades. E no essencial ensinamento da vida sobre a felicidade, de como ela se aproxima de quem se alegra por natureza.
Cristina André
cristina.andre.gazeta@gmail.com
Publicado em 25/11/22