Quatro Crianças

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A primeira das quatro crianças que receberam a luz da vida através do Pai e da Mãe foi minha irmã, que durante três anos reinou absoluta. E como toda princesa mirim, deve ter sido mimada e paparicada em doses superiores àquelas que recebemos. Aos quatro aninhos, já estudava música na Capital, para onde era levada pela Mãe, em “carro de praça”, duas vezes por semana, pois a família morava em Tapes. Seu nome foi o mesmo de uma tia materna, que não chegamos a conhecer, combinado com as crenças religiosas das duas avós imigrantes, uma italiana, a outra francesa.

Quando a soberania da primogênita completava três anos, chegou a segunda criança da família, o primeiro guri, provocando suspiros na parentada pelos belos olhos azuis e os cabelos dourados. Sua principesca beleza infantil invadiu inclusive a escola, onde foi apelidado pelas freiras de “olhos do menino Jesus”. E mesmo sendo muito arteiro, metido a jogador de futebol no recreio e até na hora da aula, era sempre perdoado pela madre superiora, de quem acabava recebendo afetuoso sorriso. Foi batizado com um nome que tem muito a ver com a data de sua chegada ao mundo, véspera de São João, completado pelas histórias de um rei europeu.

Já tinham um casal de filhos quando a vida, cumprindo a diferença de três anos entre a mais velha e o primeiro menino, colocou mais um presente nos braços da Mãe. E lá estava ele, o segundo guri, pronto para fazer parceria com o primeiro, garantindo o lugar de destaque da primogênita. De olhos e cabelos escuros, era o que mais se parecia com o Pai. Introvertido, dava grande valor ao sorriso, que não costumava distribuir com facilidade. Passava os dias brincando com seus minúsculos carrinhos, dizendo que seria oficineiro. Recebeu o nome de uma forte e valiosa raça de gado do Oriente, influência das leituras paternas, completado, é claro, com a religiosidade das avós.

Mais de quatro anos se passaram, e a construção daquela família, no que se referia à prole, deu-se por encerrada em comum acordo entre o Pai e a Mãe. Com as três crianças, já estava de bom tamanho. Contudo, em uma decisão secreta, o universo mudou os planos daquele casal, transformou a sequência matemática da maternidade, que acontecera de três em três anos e já estava declaradamente finda.

Cinco anos se passaram e, independente dos antigos projetos, eis que nascia uma nova criança, a segunda guria, bem parecida com a primeira, agora a caçula de toda a família. Antes mesmo do nascimento, parte de seu nome já estava escolhido pela religiosidade, como acontecera com os outros. O complemento veio a pedido dos irmãos, o que emocionou sobremaneira a Mãe e o Pai.

Nas rotineiras orações, antes de dormir, ajoelhados aos pés das camas, os dois meninos diziam: “Papai do Céu, nos traga uma maninha de nome Cristina”.

E foram atendidos.

 

Cristina André

cristina.andre.gazeta@gmail.com

Publicado em 07/10/22

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