Operário-padrão

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Se você já precisou – e quem nunca? – contratar os serviços de um pedreiro, pintor, hidráulico, eletricista… vai chorar junto comigo nos próximos parágrafos.

Tive que fazer uma reforma em casa. Basicamente retoques na alvenaria deteriorada pela umidade, substituição de algumas aberturas e pintura geral em paredes, grades, portas e janelas. No mundo ideal eu deveria ter contratado uma empresa do ramo, com profissionais de arquitetura e engenharia e uma avaliação séria com orçamento, prazos e formas de pagamento. Mas… somos brasileiros e essa nossa eterna mania de querer economizar em tudo acabou por me colocar frente a frente com ‘profissionais liberais’ da construção civil. Chamei um deles. O primeiro de tantos…

Muito gentil, fez uma rápida ‘avaliação técnica’ com base numa ‘olhadinha’ naquilo que precisaria ser feito e cravou o orçamento – razoavelmente honesto – para um prazo de duas semanas. Tudo de boca, nada no papel. Eu deveria ter desconfiado. Feito o acordo, me passou uma lista de materiais: lixas, tintas, solventes, pincéis, rolos de pintura, cimento-cola, entre outras coisas. E as quantidades? Tudo no ‘chutômetro’. Fui sozinho até a madeireira. Os atendentes me ‘sabatinaram’: que marca prefere? Qual bitola? Qual o ‘grão’ da lixa? É para madeira ou alvenaria? Tinta esmalte ou acrílica? Rolo de lã ou espuma? O cimento cola é AC-2 ou AC-3? É lógico que comprei tudo errado…

Nos dois primeiros dias de trabalho parecia que tudo ia bem. Muita bagunça, poeira, ferramentas sujas espalhadas pelo chão, todas as coisas fora do lugar… mas isso faz parte do jogo da obra. No terceiro dia, ele chegou tarde e numa indisfarçável ressaca alcoólica. Tomou um café, fumou um cigarro contemplando o céu por um bom tempo, brincou com o cachorro e conversou demoradamente com um vizinho que, mais tarde descobri o teor do diálogo: era um pedido de orçamento para uma reforma. Nesse momento, o foco do meu pedreiro passou a ser a obra da casa do vizinho. Contrariado, trabalhou por mais algumas horas e não retornou na parte da tarde. No outro dia me avisou que não poderia vir pois um ‘funcionário’ seu, de outra obra, sofreu um acidente e precisou de atendimento médico. Isso, é claro, demandou um ‘adiantamento’ financeiro. Na manhã seguinte me enviou uma mensagem dizendo que sua neta, de 3 anos, passou a noite com febre e precisava levá-la numa UPA. Mais um dinheirinho. No quinto dia, ‘me visitou’ apenas na parte da tarde para ‘pegar um vale’. Afinal de contas, era sexta-feira, né? Argumentou que passou a manhã com um advogado pois caíra no golpe dos nudes…

Os dias foram passando. O repertório de desculpas, interminável. A obra cada vez mais longe do fim. Paguei a última parte do acordo que combinamos e, é claro, ele sumiu. Me bloqueou nas chamadas de telefone. Contratei outro e mais uma pequena fortuna na compra de novos materiais. O custo da mão de obra, segundo ele, seria mais ‘salgada’ porque ‘era preciso refazer muitas coisas que o outro tinha iniciado e não terminou ou fez mal feito’. Admito que era mais eficiente na administração do tempo, mas o acabamento do seu trabalho era duvidoso. Passados alguns dias, me disse: “hoje eu termino”. Contestei, porque ele ainda nem havia iniciado a parte de dentro da casa. “Mas o preço que lhe dei era apenas para a parte de fora. Está no seu wattsApp”, resumiu.

Veio o terceiro pedreiro para fazer a parte de dentro. Nova ida às madeireiras. Nesse meio tempo, descobri um vazamento de água em algum lugar da casa. Chamei um hidráulico. Durante alguns dias, ele ‘escutou todas as paredes’ com uma espécie de estetoscópio. Depois, escavou algumas delas. Resolveu o problema que, é lógico, custou caro. Perguntei quando faria a restauração dos buracos que deixou a minha casa parecida com o solo da lua. E veio o tiro de misericórdia: “essa parte não é comigo, o senhor tem que chamar um pedreiro…”

Daniel Andriotti

Publicado em 10/3/23

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