Admito que sou um saudosista. Por isso, todas as vezes que participo de alguma roda de discussão sobre meios de comunicação, respondo sempre uma mesma pergunta: qual é o meu veículo preferido? O rádio, é claro. Por que? Por ser seletivo, eficiente, imediato e de baixo custo. Tem mais: é dinâmico, onipresente e o mais interativo dos meios de comunicação, além de ser o único que utiliza apenas um dos nossos cinco sentidos, permitindo que possamos realizar diversas outras atividades ao mesmo tempo. Talvez por isso, o rádio nunca perdeu seu espaço e foi se reinventando com o passar do tempo.
Classificado como o ‘companheiro de todas as horas’ tornou-se o veículo mais utilizado pelas pessoas, sem distinção de idade ou de classe social e sobrevivendo incólume ao aumento da globalização e da tecnologia. É o único veículo capaz de ativar a cada segundo a imaginação de cada um, despertando sensibilidade e permitindo que se crie imagens únicas e pessoais. Há quem o considere um instaurador de novas sociabilidades e, consequentemente, um grande agente de mudanças sociais. É o multiplicador do triunvirato jornalismo, música e publicidade.
Já escrevi outras vezes nesse mesmo espaço que meu pai adquiriu nosso primeiro aparelho de TV em 1974 para que a família pudesse assistir à Copa do Mundo da Alemanha. Era uma Philco, preto e branco, 26 polegadas, comprada de segunda mão de um vizinho que havia adquirido uma colorida, recém lançada. Eu tinha sete anos. Antes da sua chegada, o rádio era o protagonista do entretenimento e da informação na minha casa, desde a manhã até à noite. As principais emissoras – todas em AM – eram Guaíba, Farroupilha, Difusora, Itaí, Caiçara. Somente algum tempo depois é que foram ‘surgindo’ as FM’s.
Assim como todas as grandes invenções da humanidade, há controvérsias quando o assunto é ‘quem criou’ o rádio? A tese mais forte é que ele teria sido uma descoberta do padre e cientista gaúcho, nascido em Porto Alegre, Roberto Landell de Moura, lá por 1893; muito embora existam registros de que em 1888 o alemão Heinrich Hertz provou a existência das ondas eletromagnéticas. Na verdade, o que Landell de Moura conseguiu foi transmitir a fala através de ondas magnéticas sem fio. Hoje, é o que chamamos de wireless. Três anos depois, o italiano Guglielmo Marconi reivindicou a patente da invenção. No Brasil, a primeira emissora de rádio surgiu em 1919, creditada à Radio Sociedade do Rio de Janeiro e idealizada por Edgard Roquete Pinto, considerado o pai do rádio brasileiro. Mas a emissora só foi reconhecida oficialmente no dia 7 de setembro de 1922, durante um evento internacional em comemoração ao centenário da Independência. A partir daí o rádio passou a trazer o mundo para dentro de casa. Esse fantástico meio de comunicação revolucionou a relação cotidiana do indivíduo com a notícia. Além, é claro, de tornar-se um excelente meio de divulgação de outras manifestações artísticas. Hoje, infelizmente, a clássica imagem de uma enorme caixa de madeira falante representa um tipo de rádio que só existe nos museus.
Escrevi essas mal traçadas linhas para homenagear alguém que nos deixou. Essa semana o microfone do rádio gaúcho perdeu um dos melhores profissionais que conheci: Armindo Antônio Ranzolin, narrador, apresentador e gestor de equipe de esportes, com passagens pela Farroupilha, Guaíba e Gaúcha e que sempre abria suas narrações e comentários com um solene “alô, amigos”. É muito raro encontrar no atual momento do rádio brasileiro um profissional de rádio que seja um narrador sem bordões, de voz com timbre limpo, dicção, pronúncia e português corretos. Ranzolin era um desses. Sofreu por muitos anos até ser derrotado na última quarta-feira aos 84 anos, por complicações decorrentes do Alzheimer.
Uma pena. Uma perda.
Daniel Andriotti
Publicado em 19/8/22