Lobby e Apneia

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Muitas pessoas costumam recorrer aos profissionais da área de comunicação quando o ‘termo da moda’ – e eles são muitos – foge ao conhecimento da maioria. Outro dia, numa conversa com alguns estudantes, alguém me perguntou o que era ‘lobby’? Respirei fundo e… vamos lá: disse a ele que lobby é uma palavra de origem inglesa e que pode ser traduzida como ‘antessala’ ou ‘salão’. Por conceito trata-se de uma atividade em que empresas, entidades e até mesmo pessoas físicas lutam para viabilizar seus interesses perante um público-alvo. Uma espécie de pressão ou persuasão em prol de alguma coisa. Ponto, nova linha, parágrafo.

No entanto, o lobby nos últimos tempos, ficou muito rotulado de forma negativa pela insistente associação à política o que, por si só, já serve para denegrir a expressão. E, sabemos, quase tudo o que cai no vocabulário político-partidário brasileiro é imediatamente ‘rotulado’ como atividade ilícita, escusa, ilegal. Mas é preciso entender que lobby é um trabalho legítimo desde que validado pelos conceitos da ética e da moral. Em qualquer segmento.

O estudante me pediu um exemplo que não fizesse parte desse cenário político-partidário. E na hora me ocorreu um que eu tinha acabado de ver e ouvir no rádio e na TV: numa terça-feira do inverno gaúcho, os principais noticiários com a previsão do tempo anunciavam uma possível queda de neve para o final de semana, ‘muito provavelmente’ em Gramado e Canela. Na verdade, a informação foi utilizada como um ‘lobby’ patrocinado pela associação dos hotéis, pousadas e restaurantes da serra gaúcha. Dada a notícia, as reservas de hospedagens – que nunca baixam dos 80% de ocupação nessa época do ano, na chamada ‘alta temporada’ – saltam imediatamente para acima de 200%. Com isso, é lógico, cria-se um ágio absurdo e forma-se uma imensa lista de espera. A estrada, como não poderia deixar de ser, já na manhã de sexta-feira se transforma numa fila indiana de automóveis serra acima. O lobby nesses casos e para um determinado segmento de público sempre é muito eficiente. Se será eficaz, vai depender da neve, que dificilmente cai. Mas quem foi para lá, não se importa. Para os noticiários, basta dizer que a meteorologia não é uma ciência exata e a natureza não colaborou. Feita a justificativa, vida que segue. O dinheiro dos turistas está no caixa.

 

* * *

Já que o assunto é esse, seguimos naquela região: ninguém duvida que nas ruas, nos cafés, nas lojas, nos restaurantes, hotéis, pousadas e demais ambientes requintados da maioria das cidades da serra gaúcha respira-se um ar europeu. Tudo faz parte de um contexto associado à qualidade de vida injetada no corpo e na alma dos turistas. E as duas expoentes dessa região, lógico, Gramado e Canela, foram planejadas para o turismo. E é claro que isso tem um preço.

Ano passado, um Projeto de Lei foi enviado à Câmara de Vereadores de Gramado sugerindo uma taxa de cobrança para entrada dos visitantes, variando conforme o tipo de veículo: R$ 5 reais para motos, R$ 15 para carros e R$ 80 para ônibus. Por se tratar de um tema polêmico, segue a discussão sem desfecho. Em 2018 a prefeitura criou a Taxa de Preservação Ambiental (TPA) – já existente em muitos municípios turísticos brasileiros – em substituição a de turismo sustentável, criada em 2015 e que cobra R$ 2 por diária na rede hoteleira do município por pessoa que não resida na cidade.

Há quem diga que em Gramado e Canela só não se paga para respirar. Ainda. Pelo menos por enquanto. O dia em que isso acontecer saiba que um ser humano adulto, sem problemas pulmonares respira, em média, 24 mil vezes por dia. Ou mil vezes por hora, 16,6 vezes por minuto. Logo, prepare o seu bolso ou se quiser economizar uns trocados na serra gaúcha, comece a praticar apneia…

 

Daniel Andriotti

Publicado em 26/8/22

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