“Geni e o Zeppelim” é um clássico da MPB. Uma verdadeira obra prima de Chico Buarque de Hollanda, lançado em 1979 como parte do espetáculo “Ópera do Malandro”. Quem conhece a música vai entender o seu contexto mais adiante.
Os dirigíveis normalmente são tratados por Zeppelim (com ‘m’) numa homenagem ao seu inventor, o conde alemão Ferdinand Von Zeppelin (com ‘n’). Nessa semana, mesmo quem vive em Guaíba, deve ter avistado um enorme dirigível sobrevoando a orla pelo lado de Porto Alegre. Ele não estava lá por acaso. Seus sobrevoos diários fizeram parte de um plano de marketing da South Summit, um evento internacional de inovação que aconteceu na capital gaúcha entre quarta e sexta-feira.
Em maio de 1937, há exatos 84 anos, a era dos gigantescos dirigíveis chegou ao fim. O último a fazer vôos comerciais de passageiros foi o maior deles, o Hindenburg, capaz de levar até 70 passageiros e com quatro motores a diesel. O Hindenburg podia voar a até 135 km/h em viagens marcadas pelo luxo e como verdadeiro ícone cultural dos anos 30. O Hindenburg voou pela primeira vez em 4 de março de 1936 e havia realizado 63 voos, incluindo sete para o Brasil. No entanto, seu fim foi o mesmo de quase todos os outros que vieram antes dele: pegou fogo e ficou completamente destruído em menos de 30 segundos. Das 97 pessoas a bordo 35 foram vítimas fatais (13 passageiros e 22 tripulantes). Um funcionário de solo também morreu.
Uma das minhas bandas de rock favoritas – sempre digo que jamais houve outra parecida – chama-se Led Zeppelin. O batismo foi feito pelo integrante de uma outra banda da época, que sugeriu “Lead Zeppelin”, prenunciando que a banda voaria como “balão de chumbo”, considerando sua tradução literal. O guitarrista Jimmy Page gostou mas tirou o “a” do Lead, para não haver dúvidas quanto à pronuncia certa.
Domingo passado eu estava lá – portanto ninguém me contou. O Inter conseguiu a façanha de jogar três vezes contra o Caxias em menos de dois meses e empatou todas. Mas a conta veio: no terceiro empate havia uma decisão por pênaltis que, é claro, o Inter perdeu e ficou de fora da decisão do Gauchão – pela quarta vez nas últimas seis edições. E, como o Inter não pode ver um fiasco sem participar, ainda promoveu uma pancadaria entre jogadores no final do jogo com transmissão ao vivo para todo o Brasil.
Mas o Zeppelim criado por Chico Buarque não pegou fogo. Ele seria o mecanismo para o bombardeio de um determinado vilarejo e, isso só não aconteceu porque o comandante resolveu passar uma noite com uma moradora do local, a travesti “Genivaldo”, a Geni. Caso ela aceitasse, a vida de todos seria poupada. Imediatamente, a cidade que a ironizava foi pedir clemência e implorar para que ela atendesse ao pedido. Como diz a música, ela também tinha seus caprichos e pensou duas vezes antes de aceitar. Mas enfim, entendeu que era hora de se redimir. Na manhã seguinte, satisfeito e saciado, o comandante do imenso Zeppelim partiu. E o alívio dela por ter salvo seu vilarejo, durou pouco: imediatamente a cidade voltou a lhe ridicularizar como sempre fez. O nome disso é hipocrisia.
Tal qual a música do Chico, o dirigível que sobrevoou o entorno do Beira-Rio essa semana também poupou as mais de 33 mil ‘Genis’ que estavam lá domingo tentando empurrar o time. Contra quem mesmo? Contra o Barcelona? Contra o Real Madrid? Contra o Manchester City? Não. Era contra o Caxias. Quando percebeu que Geni não tinha mais nenhuma utilidade, a cidade voltou a tratá-la com o mesmo desprezo. Assim é o Inter. A direção implora a presença do torcedor na hora do aperto e diz que ela é fundamental. Mas quando a desgraça vem e é hora de colocar qualidade no elenco para tentar ao menos chegar a uma final de campeonato Gaúcho, essa mesma direção vira as costas e parte numa nuvem fria, com seu zepelim prateado…
Daniel Andriotti
Publicado em 31/3/23