Certa vez, um grupo de bandidos atacou uma aldeia. Entraram nas casas e violentaram todas as mulheres. Exceto uma, que resistiu. Lutou bravamente contra o seu agressor. E conseguiu matá-lo. Não satisfeita, o decapitou.
Depois que os outros bandidos completaram a violência contra as demais mulheres, foram embora. Todas elas saíram de dentro das suas casas, chorando muito e resgatando o que restou das suas dignidades e das roupas rasgadas e ensanguentadas que ficaram pelo chão. Todas, menos aquela. Ela saiu de casa e veio com a cabeça do bandido nas mãos, segurando-a pelos cabelos. Seu olhar estava cheio de raiva, mas também de orgulho. Então ela disse:
– Pensaram que eu deixaria que ele me violentasse? Não!!! Era matar ou morrer. Eu preferi matar…
As demais mulheres da aldeia olharam umas para as outras e no mesmo momento decidiram que ela deveria ser morta, para que não ficasse orgulhosa da sua honra e para que os seus maridos não lhes perguntassem ao voltar do trabalho, “por que não resistiram como ela?”
Então, foi atacada e morta pelas outras mulheres (mataram a honra, para viver a vergonha).
Assim está a sociedade brasileira: sendo estuprada pelos corrompidos. E aqueles que se levantam para lutar contra a injustiça são imediatamente silenciados!!!
* * *
Semana passada, mais exatamente no dia 24, passaram-se 70 anos do suicídio de Getúlio Vargas. Gaúcho de São Borja, nascido numa família de ricos e estancieiros, construiu sua carreira política no Rio Grande do Sul, mas no final da década de 20 projetou-se no cenário político nacional. A Revolução de 1930 elevou a carreira política de Vargas a um novo patamar. Na segunda vez que chegou a presidência da república, tentou governar dentro dos limites constitucionais. Todavia, a oposição da União Democrática Nacional (UDN) fez com que esse período ficasse marcado por crises políticas. Nesse governo, Vargas procurou defender uma política econômica nacionalista que dava prioridade para que a exploração dos recursos nacionais fosse realizada por empresas estatais e que o capital estrangeiro tivesse influência reduzida. Também defendia que o Estado deveria interferir constantemente na economia como forma de garantir o desenvolvimento econômico do país.
Procurou aproximar-se dos trabalhadores como forma de garantir sustentação ao seu governo, mas fracassou. Em 1954, um dos opositores políticos de Vargas, Carlos Lacerda, sofreu um atentado e descobriu-se que o mandante era o fiel escudeiro do presidente: Gregório Fortunato. Isso soou como um verdadeiro escândalo nacional e amplificou a crise do governo. Vargas ficou acuado com os ataques e os pedidos de renúncia. Até que no dia 24 de agosto, em seu quarto no Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, Vargas atirou contra o próprio peito. Deixou uma carta-testamento – hoje exposta em inúmeras praças do país – justificando sua ação com a célebre frase: “…saio da vida para entrar na história”.
Mais ou menos o que fez a mulher que decapitou seu algoz mas foi morta pelas violentadas.
Daniel Andriotti
Publicado em 6/9/24