Gosto é gosto

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Há quem diga que a ignorância é uma benção. Diante dessa afirmação, eu me sinto um abençoado por ignorar o prazer de ter ou dirigir um carro com a suspensão rebaixada. Principalmente pelas ruas estupidamente esburacadas de qualquer uma das 5.570 cidades brasileiras. Mas esse é um assunto que divide opiniões…

A lei permite. O artigo 6º da resolução 292 do Conselho Nacional de Trânsito estabeleceu regras para isso. “Carros de passeio, com até 3.500kg poderão rodar com a suspensão rebaixada desde que respeite a altura mínima de 10 cm entre o chassi e o chão”. Sob o ponto de vista da opção e da estética, quem tem um carro com a suspensão rebaixada está pouco ligando para aqueles que, como eu, não gosta de um ‘carro rebaixado’. Via de regra é uma ‘galera’ mais jovem que também não está muito preocupada com o comprometimento de algumas funções do carro, muito menos com a performance, segurança ou com o gasto excessivo e disforme dos pneus e amortecedores, entre outros problemas – que viram despesas. E cá entre nós, ela também tem todo o direito de pensar e de dizer: “comprei e paguei com o meu dinheiro e ninguém tem nada a ver com isso”. Até aí tudo certo, diz o Detran, desde que as taxas para este tipo de veículo estejam todas em dia. Outro detalhe: um dos critérios que influencia no preço do seguro do carro é se ele tem o sistema de suspensão original ou se é rebaixado. Logo, as seguradoras também olham com uma certa desconfiança para os donos de carros rebaixados. E o preço da apólice entende esse olhar…

O que é questionável nessa atitude é o descaso com o trabalho da engenharia automotiva: anos a fio de estudos para identificar e aplicar formas ao dimensionar o sistema de amortecimento de um carro com um objetivo único: que as pessoas possam trafegar com estabilidade e segurança. Daí a criatura vai lá e literalmente ‘corta as molas’ deixando o carro ‘socado e arrastando o assoalho no chão’, alterando completamente as características originais. Um carro, definitivamente, não foi feito para isso. Assim, seus usuários ficam sentados muito próximos do solo, ‘quicando’ pelas ruas e sentindo todas as muitas imperfeições de qualquer piso por onde ele trafegar, sem aquele mínimo conforto que o carro oferecia no momento em que foi projetado.

Existem dois tipos de carros rebaixados: o moderado, onde a alteração da suspensão não atrapalha a ergonomia e a eficiência do carro – e até o ajuda nisso, no caso de rebaixamentos esportivos ou para competição. E tem o radical, tipo aberração onde a parte de cima da roda é engolida pelo para-lamas. Aquele em que o quebra-molas vira um obstáculo quase intransponível. Passar pela lombada somente na diagonal, a 1 km por hora. E para o desespero de quem vem atrás e com alguma pressa.

Outras duas constatações: quem é dono de um carro rebaixado tem a síndrome de piloto da modalidade ‘quilômetro de arrancada’. Seu olhar o denuncia que ele está sempre preparado para um ‘pega’, um ‘racha’ com o veículo ao seu lado. A segunda: 98% dos donos de um carro rebaixado tem um gosto musical duvidoso, pois o funk-pancadão-periferia é um dever nos muitos decibéis emitidos pelos alto-falantes que ocupam todo o porta-malas do veículo. Vergonha alheia. Anotei o que estava escrito em dois adesivos que vi outro dia em alguns carros rebaixados. Um deles dizia: “as formigas que se abaixem”. E outro: “O azar é do próximo dono”…

Gosto é gosto e não se discute. Apenas se lamenta…

 

Daniel Andriotti

Publicado em 20/5/22

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