Há exatos quatro anos eu escrevi nesse mesmo espaço:
“O mundo está em surto. Em pânico. Em desespero.”
Sim, naquele momento em pouco mais de 72 horas a existência humana na terra passou a ser questionada. Absolutamente tudo mudou. A nossa velha rotina, da qual muitas vezes reclamávamos, passou a não mais existir. A fobia social fez as ruas ficarem desertas, os restaurantes, os clubes, os bares, as academias, os shoppings, as empresas… tudo vazio. Os únicos lugares onde ainda víamos pessoas reunidas era nas farmácias e, infelizmente, nos hospitais. O resto, entocado feito tatu. Teve o bloco dos ‘sem noção’ como se nada estivesse acontecendo e por esse motivo, muitos deles não estão mais aqui. Alguns supermercados lotaram: criaturas egoístas empurrando carrinhos cheios de papel higiênico. Não havia essa necessidade. As expressões de sobrevivência eram clausura, resignação e readaptação.
Naquele momento nosso maior desafio era manter a saúde… mental. Ocorre que para não se contaminar com o vírus, as pessoas se ‘auto medicavam’ de más notícias. E então, ficavam cada vez mais tomadas pelo pânico provocado pelo excesso de mensagens que recebíamos pelo WhatsApp. A quantidade de áudios e vídeos alarmantes só não era mais agressiva que o próprio vírus. Os ‘especialistas’ surgiam de todas as partes e não davam quarentena para seus dedos nervosos na hora de enviarem um bombardeio de bobagens. Principalmente sobre as tragédias.
No estado de calamidade em que nos estávamos – como nunca antes na história recente do mundo – a espécie humana optou pelo lado negativo das coisas. Somos pessimistas por natureza e por isso perdemos a noção de que o medo derrubava a nossa imunidade. Passamos por um momento de grande incapacidade de discutir, de forma equilibrada, as nossas mazelas. Tanto nas questões pessoais, quanto nas coletivas. E a gente tem por costume se apegar naquilo que nos mete medo. Portanto, seria evidente que perdêssemos o ‘filtro’ da enxurrada de informações que recebíamos enquanto o mundo agonizava. Isso incluía o que líamos, o que assistíamos e o que se ouvia.
Um dos tantos ‘x e y’ da questão envolvendo o Corona vírus é que no momento em que olhávamos para um número de infectados, ele rapidamente se tornava muito maior porque sua progressão era aritmética: ia dobrando ou triplicando em poucas horas, em poucos dias. E sem estratégias de contenção, o vírus realmente não tinha por que parar de se espalhar num curto prazo de tempo. Tudo o que estávamos vivendo era um remédio extremamente amargo. E diante de todas as dificuldades, penso que o Brasil – bem ou mal – acabou fazendo o que China e Itália não fizeram. Adiaram as decisões do que realmente precisava ser feito.
Mesmo diante de tantas incertezas de como se propagava o vírus, não sabíamos direito como ou se o distanciamento social poderia funcionar bem num país como o Brasil. No Rio, por exemplo, como se resguarda as favelas que concentram milhares de pessoas muito próximas umas das outras? Tudo isso associado à precariedade dos serviços de saúde pública e, descobrimos na dor, da saúde privada também. Havia dois únicos caminhos: um, viver em risco – ir para a rua e se entregar pro inimigo oculto – e o outro, sucumbir ao medo, como se pudéssemos nos embalsamar com álcool gel e entrar para debaixo da coberta. O ideal não era uma coisa nem a outra. Era preciso seguir tentando funcionar normalmente, pensando e agindo com serenidade, precaução e coerência, fugindo da paralisação, da letargia, do medo e, principalmente, das fake news. E sofrendo sim, cada vez mais, com a falta de um abraço, de um beijo e de um aperto de mão.
Mas enfim, passou. Ufa!!! Quem (sobre) viveu, viu!!!
Daniel Andriotti
Publicado em 22/3/24