Desde a infância, sempre gostei de histórias contadas por pessoas mais velhas, especialmente as da nossa família. A maior parte do que ouvia, porém, fui compreendendo com o decorrer do tempo, na medida em que minhas próprias experiências aconteciam, conectando-me àqueles antigos e importantes relatos.
Assim tem acontecido nestes dias de enchentes e dificuldades para o nosso povo, minha vida real a toda hora se confundindo com as lembranças do que a Mãe contava. Sobre o avanço das águas no ano de 1941, quando a cidade de Guaíba era bem pequena; o lago era um rio; e, Ela, apenas uma mocinha assustada.
Com o tempo, todo mundo se ajudando, tudo foi se ajeitando, dizia a Mãe. Porque, em todas as suas histórias, mesmo naquelas envolvidas em muita tristeza, como a da “enchente de 41”, sempre havia um final contornado pela esperança, perita que Ela sempre foi em ter fé na vida.
Foi também naquela casa, em frente ao Guaíba, onde a enchente de 1941 deixou marcas da audácia das águas quando a Mãe era apenas uma mocinha, que nós, os seus filhos, fomos guris e gurias felizes. Lá nos tornamos adultos reconhecidos pelo esforço materno em nosso benefício, tomando para si a tarefa de alegrar nossas vidas, marcadas pela perda precoce do pai, o homem que Ela tanto amou.
Neste exato momento de procurar uma boa história para contar a toda gente, em meio ao caos e à tristeza em que se encontra nossa região, meus olhos são banhados pela emoção, meu coração transborda em lembranças e saudades, em orações aprendidas pela fé materna, na certeza de que todas as histórias devem ser contadas e escritas com o contorno da esperança.
Agora eu entendi, Mãe!
Cristina André
Publicado em 10/5/24