Poucos dias depois da mãe ter me dado à luz, no Hospital Beneficência Portuguesa, em Porto Alegre, eu já estava na nossa casa, em Tapes, às margens da Lagoa dos Patos, levada no colo materno. Foi naquela cidade tranquila que vivi a primeira infância, iniciei meus estudos no Ginásio Nossa Senhora do Carmo (colégio das freiras), onde aprendi a ler e escrever. No teatro da escola, fizemos sucesso, eu e meus colegas do primeiro ano primário, apresentando a dança do “Pezinho”, cuja fotografia guardo com muito carinho.
De tudo isso me lembrei, em novembro próximo passado, na inauguração da estátua de José Claudio Machado, no Largo que leva o seu nome, às margens do Lago Guaíba. Quando soube que o artista era tapense e, como eu, tornou-se guaibense de moradia e coração.
Devo ser sincera, porém, ao revelar que, apesar de ter conhecimento a respeito do talento artístico e da importância do homenageado para a cultura gaúcha, sei muito pouco do seu repertório. Na verdade, nunca tive o hábito de ouvir música gauchesca tampouco de frequentar CTGs, segui essa característica familiar. Depois daquela adorável e meteórica experiência artístico-folclórica da infância, nunca mais fui vista de prenda.
Esclarecimentos feitos, vamos ao fato que me emocionou sobremaneira, fazendo-me entender melhor as razões de homenagearem José Claudio Machado com uma estátua.
Estávamos na festa de aniversário de um casal de amigos, no último sábado, que teve boa música ao vivo. Violão e voz em perfeita harmonia, foram interpretados clássicos do rock internacional e brasileiro, de John Lennon a Capital Inicial; sambas atuais e relíquias de Adoniran Barbosa, momentos especiais de Belchior e Raul Seixas. Tudo ao gosto dos convidados, que exerceram a liberdade de pedir músicas, concedida pelo artista, que respondia de pronto.
Eis que um dos convivas pediu que ele tocasse “Milonga Abaixo de Mau Tempo”, composição de Mauro Moraes, que se transformou em clássico na voz de José Claudio Machado. O músico, sorrindo, disse já saber que pediriam essa. “Afinal, é uma festa em Guaíba”, concluiu.
De repente, aqueles que pareciam roqueiros de carteirinha, e até os sambistas juramentados que lá estavam, começaram a gritar “hino de Guaíba” e foram se aproximando do cantor. Ao som apenas do violão, a emoção começou a se esparramar pela festa, um silêncio respeitoso se deu para apreciar.
Quando a letra da canção entrou em cena, um grupo foi além do “cantar junto”, colocando alma na interpretação dos versos, seguindo a trilha do artista que virou estátua. E não houve quem não se emocionasse.
Naquela festa, ao som de rock, pop internacional e o melhor da MPB, ficou muito claro que uma estátua para José Claudio Machado, no Largo que leva seu nome, é mais do que justa.
Cristina André
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Publicado em 17/2/23