A Casa das Sedas

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Minha sogra costumava contar uma história da qual a família toda achava graça. Sobre uma compra que ela fez na Casa das Sedas, a melhor loja de tecidos que havia em Porto Alegre para quem precisasse fazer vestido de festa.

Devo explicar aos mais jovens que aquela era uma época em que não havia roupa pronta para casamentos, quinze anos, bailes de debutantes, bodas em geral. Era preciso comprar tecido especial e levar para uma boa costureira, que fosse de confiança e não cobrasse muito caro pelo “feitio”, como era chamado o valor pago pelo importante trabalho artesanal.

Toda boa profissional da costura tinha exemplares das revistas Manequim, Figurino, Burda e Cláudia Modas. Era naquelas páginas especializadas que as mulheres encontravam sugestões modernas sobre modelos e tecidos adequados, sapatos e bolsas que ficariam bem. Tudo isso com a fundamental opinião de quem iria construir a roupa.

Eis que a Casa das Sedas, famosa e requintada loja de tecidos localizada na Rua da Praia, Centro da Capital, começou a fazer essa tarefa de maneira sofisticada, conquistando corações femininos com o sonho encantado de vestir modelo único e de bom gosto, mesmo que ainda precisasse da costureira.

Funcionava assim: comprava-se o tecido, contando com a orientação de senhoras que entendiam do assunto, sabiam o que caía bem em cada tipo físico, quais tecidos ficariam melhor no horário e no local da festa em questão. Feita a escolha, tiravam medidas, cortavam, providenciavam linhas, zíper, botões, e entregavam tudo para o desenhista de moda contratado pela loja.

Verdade seja dita, saía bem mais caro aquele pacote feminino de elegância. Todas as mulheres daquela época sabiam, inclusive minha querida e saudosa sogra, cuja costureira era uma de suas amigas, a Matilde. E foi ela quem sugeriu a Dona Alda que fizesse uma visita à Casa das Sedas só para conferir a novidade, ver como era o atendimento do modista exclusivo. Minha sogra gostou da ideia e aproveitou uma ida ao Mercado Público para dar a tal “passadinha” na loja.

Depois de ir na Casa Masson para encomendar seus óculos novos, ver um batom na Casa Lyra e umas bijuterias na Sloper, pedido da filha mais velha, deixou o Mercado para depois e entrou na Casa das Sedas. E o que seria um simples e rápido passeio entre peças de tecidos e uma espiada discreta no trabalho do desenhista transformou-se em gasto exorbitante que não estava no orçamento.

Dona Alda gostava de contar que, encantada com aquela loja de atendimento maravilhoso, acabou comprando um corte nobre e caríssimo, teve seu vestido de festa desenhado pelo profissional e voltou para casa sem entender direito por que fizera aquela compra.

Quando chegou e abriu o pacote, começou a chorar. Os filhos, crianças, não entenderam o que estava acontecendo. O sogro, ao tomar ciência do montante gasto, quis saber as razões daquela despesa sem necessidade e fora do que estava planejado. A sogra disse que não sabia responder, que parecia ter sido hipnotizada pelas peças de renda e mousseline, de guipure e seda natural; que perdera a razão pelo excesso de encantamento.

Mas aquele choro logo se transformou em alegria. O vestido ficou lindo, o sogro elogiou, a festa estava ótima, a Matilde ganhou fama como costureira e a Dona Alda virou cliente da famosa loja de tecidos. Por precaução, apenas, decidiu nunca mais ir sozinha na Casa das Sedas.

 

Cristina André

cristina.andre.gazeta@gmail.com

Publicado em 12/11/21

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